Após quase dez anos de um aumento significativo nos registros de microcefalia no Brasil, resultado do surto de zika vírus, o país enfrenta outra inquietante situação de saúde pública. Especialistas alertam para o possível crescimento nos casos de malformações fetais devido ao vírus oropouche.
Na última quinta-feira (08/08), o Ministério da Saúde anunciou um caso de um recém-nascido no Acre com anomalias congênitas vinculadas à infecção vertical por oropouche, transmitido de mãe para filho. Infelizmente, o bebê faleceu após 47 dias. As investigações revelaram que a mãe, de 33 anos, apresentara os sintomas da infecção durante o segundo mês de gestação.
Além desse caso, o Ministério também informou sobre um aborto espontâneo relacionado à infecção, e investiga outras oito situações suspeitas de malformação e óbitos fetais entre recém-nascidos de mães diagnosticadas com o vírus.
A verdadeira frequência dessas malformações ainda é desconhecida, mas o potencial de aumento existe ainda que a extensão desse aumento seja difícil de afirmar. Embora a possibilidade de uma epidemia de oropouche leve a um surto de microcefalia em grande escala seja improvável, não é impossível.
Preocupações com a Circulação do Vírus
Luiz Tadeu Moraes Figueiredo, microbiologista da USP, revela sua preocupação com a circulação deste vírus em potencial causador de malformações. “Não sabemos o tamanho da ameaça”, enfatiza. Figueiredo já havia previsto, em 2017, que oropouche poderia se tornar um problema sério de saúde pública no Brasil, especialmente após identificar casos em primatas em Minas Gerais e no sul da Bahia.
O Brasil já enfrentou consequências devastadoras do zika vírus, que resultou em um acentuado aumento nos casos de microcefalia. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) indicam que, entre 2000 e 2014, 2,4 mil casos de microcefalia foram registrados, mas em 2015 sozinhos foram notificados 1,6 mil casos, com 71% dessas ocorrências no Nordeste.
A Expansão do Oropouche
A Organização Pan-americana da Saúde (Opas) emitiu um alerta epidemiológico ao Brasil, recomendando uma vigilância epidemiológica mais rigorosa frente à febre oropouche, especialmente considerando que o país abriga 90,9% dos 8.010 diagnósticos da doença no continente. Nos primeiros meses de 2024, as notificações apresentaram um aumento de 776% nos casos em comparação ao ano anterior, totalizando 7,2 mil ocorrências já registradas.
O crescimento nos casos aumenta o risco de infecções entre gestantes. Ribeiro explica que vírus como o zika podem invadir o feto ao penetrar na corrente sanguínea materna, especialmente durante o primeiro trimestre. O oropouche parece seguir esse padrão.
Infelizmente, ainda não existem dados conclusivos sobre os efeitos neurológicos do oropouche em bebês, embora estudos dos anos 80 tenham indicado que bebês nasceram com malformações após a infecção das mães.
Medidas Necessárias e Estudos em Andamento
A vigilância na detecção da febre oropouche deve ser ampliada. Para isso, o Ministério da Saúde já começou a distribuir testes diagnósticos a diferentes estados, permitindo uma identificação mais eficaz dos casos. Para uma doença de importância de saúde pública, o diagnóstico precisa ser acessível em todas as regiões, não somente nas capitais dos Estados.
Monitorar os casos é crucial para proteger as gestantes durante o período pré-natal. Recomendações incluem o uso de repelente apropriado, a limpeza dos ambientes para evitar a proliferação do vetor e o uso de roupas adequadas.
Ademais, o Ministério da Saúde criou três grupos de pesquisa focados no estudo do vetor da doença e das características do vírus. A oropouche era negligenciada, mas à medida que avança para áreas urbanas, a atenção tem crescido. O avanço das pesquisas é essencial, pois maior conhecimento pode levar ao desenvolvimento de uma vacina.