Entenda por que a obesidade é mais do que apenas comer demais e não se exercitar

Entenda por que a obesidade é mais do que apenas comer demais e não se exercitar

A Complexidade da Obesidade: Um Desafio Global e Seus Preconceitos

A obesidade, considerada uma doença crônica, afeta mais de um bilhão de pessoas em todo o mundo, segundo um estudo publicado este ano na revista The Lancet. No Brasil, essa condição se tornou uma preocupação alarmante, com um em cada quatro adultos apresentando obesidade, de acordo com dados do Ministério da Saúde. As previsões são sombrias: com o crescimento atual da doença, quase 50% da população brasileira poderá ser diagnosticada até 2044, de acordo com análises da Fiocruz.

Apesar dos números impressionantes, a percepção popular sobre a obesidade é frequentemente simplista. Muitas pessoas acreditam que a condição é resultado apenas de maus hábitos alimentares e falta de exercícios físicos. Esse entendimento, comum tanto entre leigos quanto entre profissionais de saúde, é considerado errôneo e prejudicial para a compreensão mais profunda da doença. Essa visão não só limita o reconhecimento das nuances da obesidade, mas também contribui para estigmas que afetam negativamente os pacientes.

O Que Significa "Rebranding" da Obesidade?

A ideia de “rebranding” da obesidade, conceito originado no marketing, refere-se à necessidade de redefinir como essa doença é encarada e tratada na sociedade. O nutrólogo Guilherme Giorelli afirma que é fundamental discutir influências que moldam a percepção da obesidade.

“Discutir o rebranding da obesidade é, em última análise, discutir sobre pessoas. Muitos veem a doença como simples falta de força de vontade, excesso de alimentação e falta de exercício. Isso não apenas é incorreto, como também é um discurso ultrapassado”, destaca Giorelli durante um importante evento na área da saúde.

Além disso, ele sugere que essa concepção limitada leva à falta de uma identidade clara para a obesidade, que deveria ser reconhecida como uma condição médica séria, semelhante a outras doenças crônicas, como diabetes e hipertensão. A falta de reconhecimento e a definição da obesidade como mero “fator de risco” dificultam políticas públicas adequadas e abordagens eficazes de tratamento.

Quais São os Fatores que Contribuem para a Obesidade?

Especialistas afirmam que a obesidade resulta de uma combinação de fatores interligados, incluindo genética, comportamentais e ambientais. De acordo com pesquisas, até 70% da condição pode ser atribuída a fatores genéticos, desafiando a narrativa popular que sugere que a solução é tão simples quanto "comer menos e se exercitar mais".

Por exemplo, o endocrinologista Bruno Halpern explica que o cérebro desempenha um papel crucial no regulação do peso corporal. O hipotálamo, uma região do cérebro, é responsável por vários processos relacionados à fome e ao peso, tornando a perda de peso uma tarefa mais complexa do que um simples déficit calórico.

“Ou seja, quando uma pessoa come menos calorias ou aumenta a atividade física, o gasto metabólico diminui e a fome aumenta em uma tentativa do corpo para retornar ao peso ‘original’”, explica Halpern.

Além disso, fatores externos, como influências ambientais, medicamentos e até mesmo padrões de sono, contribuem para desbalancear a energia no corpo, aumentando o risco de obesidade. Portanto, o tratamento deve ser abrangente, levando em conta as individualidades.

Como a Culpabilização Afeta Pessoas com Obesidade?

A visão simplista de que a obesidade é resultado de comportamentos individuais pode levar à autoculpabilização. Indivíduos com essa condição muitas vezes sentem que não estão fazendo o suficiente, o que os impede de buscar ajuda profissional.

“Como as pessoas geralmente pensam que é simples: ‘basta querer, comer menos e se exercitar mais’, elas acreditam que podem resolver tudo sozinhas”, observa Halpern. Essa mentalidade pode ser devastadora, levando a sentimentos de incapacidade e baixa autoestima, além de serem fatores de risco para problemas psicológicos, como a depressão.

As redes sociais também se revelam uma armadilha, pois influenciadores muitas vezes divulgam informações sem embasamento científico, perpetuando a ideia de que a obesidade é uma questão simples. Essa falta de compreensão faz com que a pessoa se sinta isolada e incapaz.

Por Que Há Falta de Políticas Públicas Eficazes?

A fragmentação das percepções sobre a obesidade também se reflete na formulação e implementação de políticas públicas. A visão errônea de que a obesidade é apenas uma escolha individual diminui a atenção e os recursos dedicados a essa condição.

Halpern acrescenta que, ao responsabilizar os indivíduos, a sociedade ignora a responsabilidade coletiva na criação de um ambiente que favoreça a saúde pública. "Justamente por isso, inverter essa conversa é importante, porque do jeito que está, é conveniente para a inação", alerta.

Ainda é preciso um avanço significativo na educação e na conscientização a respeito da complexidade da obesidade. Reconhecer essa condição como um problema de saúde pública, e não meramente uma questão de controle pessoal, é fundamental para a construção de estratégias que realmente façam a diferença.

A obesidade é um desafio multifacetado que requer um olhar atento e compreensivo. Falar sobre isso é um passo necessário para desmistificar o assunto, eliminar preconceitos e, acima de tudo, apoiar aqueles que enfrentam essa condição a buscarem a ajuda necessária.

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